Mudam-se os tempos, mudam-se as vontandes, já diz a sabedoria popular. Neste caso, mudam-se os tempos, mudam-se as aulas de yoga.
Por vezes dou por mim a pensar sobre o que foi mudando no meu modo de dar aulas ao longo destes anos e porquê. É natural que a mudança aconteça. Vamos amadurecendo, não apenas como professores, mas essencialmente como praticantes. E as aulas vão acompanhando essa evolução.
Quando comecei a dar aulas, praticava sempre com os alunos. Fazia tudo do princípio ao fim. Usava a aula como prática pessoal também, já que praticar nunca era demais e quanto mais o fizesse, mais cedo me "iluminava". E mergulhava na prática, de tal modo que hoje, olhando para trás, percebo que não dava a atenção que deveria dar aos alunos. Além disso, não tinha a experiência necessária para saber distinguir o que eram exercícios fáceis e difíceis para eles. Admirava-me quando via que tinham dificuldade em fazer coisas que eu achava tão básicas. "Eu" achava básicas... a questão era essa. O que era básico para mim, não o era para eles. Agora é óbvio, na altura não.
Com o tempo, sem que eu percebesse, as mudanças foram acontecendo. Não acordei um belo dia a pensar que tinha de fazer isto ou aquilo diferente. Não foi assim que aconteceu. Foi um processo (aliás, é um processo...) gradual que fez com que tenha chegado até aqui, que fez com que as minhas aulas sejam como são e que eu dê aulas da maneira que dou.
Acima de tudo, as aulas reflectem o que eu sou enquanto praticante.
Não gosto de fazer aulas com professores que falam do princípio ao fim, porque aprecio momentos de silêncio, em que estou comigo, em que me ouço a mim.
Não gosto de aulas em que há "quebras" entre os exercícios, ou seja, em que o professor pára a aula para explicar algo, ficando ali a dar uma palestra sobre determinado assunto e em que eu sou obrigada a "vir para fora" para lhe prestar atenção.
Não estou a dizer que é errado fazer isso. Mas enquanto praticante, aprecio uma aula em que o professor não diz mais do que o essencial para que eu perceba o que é para fazer e para que possa fazê-lo em segurança. Acima de tudo, gosto que a minha prática seja uma experiência contínua, do princípio ao fim. Um estado que se vai aprofundando, exercício após exercício. Um mergulho no meu interior, em que a cada momento vou mais fundo.
Talvez por isso tenha chegado ao ponto a que cheguei. Nas minhas aulas, quase não demonstro os exercícios, a não ser quando faço algum diferente do habitual, ou quando aparecem alunos novos, que ainda não conhecem os exercícios, ou que não estão habituados aos termos que utilizo. Como a maioria das pessoas que pratica comigo, já o faz há um bom tempo, estão familiarizados com grande parte das técnicas e já sabem o que pretendo só com meia dúzia de palavras.
Se hoje em dia não pratico nas aulas, não é porque acho errado fazê-lo. É uma escolha pessoal.
Ao contrário do que acontecia antigamente, agora não gosto de praticar com os alunos. Se o fizer enquanto dou aula, não sinto que esteja realmente a praticar, porque não posso mergulhar em mim como quero, já que preciso dar-lhes atenção, mas também não sinto que consiga dar toda a minha atenção aos alunos, porque estou a fazer a minha prática. É confuso de escrever e é confuso de fazer (hehehe). Parece que não estou a fazer nem uma coisa, nem outra. Por isso, quando é necessário demonstro um exercício, mas saio logo dele.
Outra razão para preferir falar, em vez de praticar com os alunos, é o facto de não querer que estejam a olhar para mim. Quero que dependam menos da visão e, acima de tudo, que se distraiam menos com a visão. Peço-lhes sempre que permaneçam de olhos fechados. No caso de precisarem abri-los, especialmente na parte dos ásanas, peço-lhes que foquem o olhar em algum ponto, de preferência numa parte do seu corpo, para que o olhar não comece a vaguear pela sala, olhando para mim, olhando para os colegas, ou saíndo pela janela, completamente perdido e distraído.
Mesmo só falando, não é raro ver os alunos a olharem para mim como se estivesse a conversar com eles, a virarem a cabeça para onde quer que me desloque. Não é raro ver alunos que, apesar de saberem o que quero que façam, ficam inseguros, olham para todo o lado, copiando algum colega. É pena é que, "por acaso", escolham sempre copiar o colega que está a fazer mal! (heheheh)
Para que possam mergulhar mais fundo nas vossas práticas, aconselho-vos o seguinte:
- Sempre que possível, fechem os olhos. Quando for necessário abri-los, não deixem o vosso olhar perdido. Foquem um ponto (seja o espaço entre as sobrancelhas, a ponta do nariz, a mão, o pé, o umbigo, etc. Para a parte que o vosso olhar apontar em cada ásana, foquem um ponto). Não se distraiam com o mundo das formas. Olhem para dentro, já que esse é o convite da prática.
- Diz um provérbio chinês, que quando o sábio aponta para a lua, o louco olha para o dedo. Não sejam esse louco. O professor aponta um caminho. Olhos postos no caminho, não no professor.
- Confiem mais no que sabem. O professor induz um exercício. Façam-no, sem necessidade de olhar para os colegas, a ver se estão a fazer igual. Se estiverem errados, o professor corrige. É para isso que está lá. Lembrem-se que sempre que olham para o vizinho do lado, não olham para vocês.
- Estejam presentes na prática e responsabilizem-se por ela. Vejam o professor como um GPS, que apenas vai orientando o caminho. O vosso corpo é o veículo e vocês são o condutor. O GPS não pode conduzir por vocês. O caminho é de cada um. O professor está lá para vos dar ferramentas que vocês têm de usar. O professor mostra o caminho, mas vocês têm de o percorrer. Se o professor diz que o pé direito vira 90 graus para fora, por exemplo, não fiquem a olhar para o pé dele, olhem para o vosso.
Resumindo, a prática é um caminho individual. Podem praticar em grupo e com o acompanhamento de alguém, mas o caminho é individual e cada um tem de percorrer o seu. Não olhem para o dedo, como o louco do ditado. Não dependam do professor. Vão para a aula com a mente aberta, com vontade de aprender e não apenas para fazer o que vos mandam e copiar o professor. Interessem-se pelo que fazem. Perguntem os porquês. Aprofundem o vosso conhecimento. Vão para as aulas para aprender o caminho, não apenas para seguir o GPS.
E não se distraiam. Os olhos fechados ajudam a concentrar, focar o olhar em pontos específicos também, etc. Mas o essencial mesmo, é a vossa vontade. Se não entrarem na aula com determinação e vontade de realmente "parar", centrar e mergulhar fundo em vocês, não há técnica, nem professor, que vos consiga levar longe.
Olá, Catarina, um bom conselho. Mudei recentemente de instrutora que explica o exercício e depois observa-nos. Ás vezes, corrige-nos, mas tal como diz, deixa que sejamos nós a percorrer o caminho. Estou a gostar imenso das minhas aulas e a conviver com pessoas muito simpáticas. Posso ser considerada a "veterana" pois a aula é ao sábado de manhã e muitas vezes, é uma aula para as pessoas experimentarem. Mas mesmo assim, já temos um grupo fixo.
ResponderEliminarBeijos e abraços
Marta
Mudam-se os tempos, mudam-se as vontades
ResponderEliminarMudam-se os tempos, mudam-se as vontades,
Muda-se o ser, muda-se a confiança:
Todo o mundo é composto de mudança,
Tomando sempre novas qualidades.
Continuamente vemos novidades,
Diferentes em tudo da esperança:
Do mal ficam as mágoas na lembrança,
E do bem (se algum houve) as saudades.
O tempo cobre o chão de verde manto,
Que já coberto foi de neve fria,
E em mim converte em choro o doce canto.
E afora este mudar-se cada dia,
Outra mudança faz de mor espanto,
Que não se muda já como soía.
Luís Vaz de Camões
Querida catarina,
ResponderEliminarIniciei o meu percurso no yoga contigo há 9 anos ;) e uma das coisas que mais admiro em ti como professora é a tua humildade e flexibilidade (fisíca e mental) :D
Adorava poder experimentar estas tuas aulas com uma Catarina igual na essência mas com estes aprimoramentos ;)
Quem sabe um dia ainda volto para o Porto
Muito sucesso
Um beijinho grande