quarta-feira, 4 de novembro de 2015

O céu também chora


Se a tristeza foi criada e se as lágrimas existem, devem ter um propósito maior do que fugirmos delas. Quando alguém tem vontade de rir, não esconde. Mas se a vontade é de chorar, a maioria reprime. Ou não chora de todo, ou espera para chorar sózinho.

Quando vemos alguém a rir, não achamos estranho. Não dizemos que pare de rir. Mas quando a maioria das pessoas vê alguém a chorar, parece ficar constrangido, sem saber o que fazer. E é muito comum dizer logo: "oh, não chores".

A tristeza é tão natural quanto a alegria. O choro é tão natural quanto o riso. Nada na natureza é permanente. A impermanência é a única grande permanência da vida. Os vários estados emocionais vão-se alternando, exactamente como o verão é seguido pelo outono...

Porque queremos apenas mostrar o nosso lado bem disposto, sorridente e guardamos o sofrimento cá dentro? Porque lidamos tão mal com aquilo que sentimos? Porque temos vergonha de manifestar as nossas emoções? Quando foi que deixamos de ser naturais e porquê?

Quando tentamos controlar as emoções, não estamos a fazer mais que reprimi-las.

Se eu estou triste, mas tento esconder a tristeza e engolir as lágrimas, estou a reprimir a tristeza. Se eu estou contente e não o mostro, estou a reprimir a alegria. Se estou furiosa, mas escondo a raiva com um sorriso, ainda que por dentro esteja a ser corroída, eu estou a reprimir a raiva.

Não sentirmos certa emoção, é uma coisa. Senti-la, mas tentar disfarçá-la, é outra bem diferente. E isso não é saudável, especialmente porque são as emoções "menos saudáveis" que tendemos a reprimir.

Porque não queremos "parecer fracos", engolimos o choro e sofremos em silêncio. Porque queremos parecer "zen", fingimos que já estamos acima dos simples mortais que ainda sentem raiva, ou ciúme. E assim vamos escondendo, reprimindo, engolindo. Acima de tudo, mentindo a nós próprios. E se é verdade o que dizem, que uma mentira, de tantas vezes ser dita, se transforma em verdade, acabamos por acreditar nas mentiras que vivemos.

"No entanto, as emoções não se podem dominar tão facilmente. Ninguém as consegue abolir. Podemos, quando muito, cobri-las com um manto de indiferença e não lhes prestar atenção, mas sem dúvida que elas continuam a afectar-nos por dentro." (Laura Esquivel)

Sempre fui extremamente sensível e durante muito tempo, deixei que o mundo me convencesse que isso era uma fraqueza. Sempre fui de riso fácil, mas também sempre me comovi facilmente. Houve muitos momentos em que contive as lágrimas, por ver que as pessoas não reagiam bem a isso e faziam-me sentir uma anormal, até que percebi que reprimir é fácil, comparado com a força necessária para nos expormos e mostrarmos a nossa vulnerabilidade, sem medo da reacção dos outros.

Temos de ser verdadeiros connosco, reconhecendo o que sentimos (seja o que for) e aceitando. A aceitação é o primeiro passo para a transformação.

As situações e pessoas na nossa vida, são apenas estímulos que despoletam reacções internas. O que sentimos, é responsabilidade nossa e "problema" nosso. Não devemos atirar o nosso "lixo" emocional para cima dos outros. Se tivermos um ataque de raiva, por exemplo, se estivermos com os nervos em franja, não devemos descarregar em cima de ninguém. Emoções são energia, que nos impulsionam para a acção. Gastemos essa energia de forma positiva. Podemos canalizá-la para o trabalho, ou para executar alguma tarefa que andamos a adiar há algum tempo. Podemos dar uma corrida, fazer uma prática de yoga bem forte, ou limpar a casa. Temos é de mexer! Mexer, queimar essa energia.

Aprenda técnicas que o ajudem a aquietar a sua mente. Pratique yoga e meditação, por exemplo. Aprenda a distanciar-se da sua mente, a observar os seus pensamentos e emoções de forma mais neutra, sem ser levado por eles de forma automática pelos caminhos habituais.

Há dias, uma amiga ligou-me num momento de crise. Disse-me que estava quase a ter um ataque de choro e queria perguntar-me se havia alguma técnica que a ajudasse a acabar com aquilo. "Chora", disse-lhe eu. Não há melhor maneira para parar com a vontade de chorar, do que chorar!

Se tiver vontade de rir, ria. Mas se tiver vontade de chorar, chore. Não sinta vergonha de chorar, mesmo que o faça à frente de outras pessos. E se alguém ficar constrangido, o problema não é seu. Não deixe que o convençam que chorar é mau, que é perda de tempo, ou que é sinal de fraqueza. Há muita gente que se chorasse, se deitasse cá para fora tudo o que reprime, seria muito mais feliz e saudável. Alem disso, se chorar fosse fácil, haveria mais gente a fazê-lo. É necessário ter muita força interior e coragem para mostrar as suas vulnerabilidades e fragilidades. Chorar não é sinal de fraqueza, mas sim de uma grande força. Muitos são os que têm coragem para colocar a sua vida em risco a praticar as mais variadas actividades radicais, saltando de precipícios e de aviões, mas não têm coragem para saltar dos maiores abismos, que são os interiores.

Como uma aluna uma vez me disse durante uma aula em que desatou a chorar: "os cremes esfoliantes limpam a pele, as lágrimas limpam a alma!". Adorei!


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