Desafiei a minha amiga Filipa Mora para que escrevesse um textinho, sobre o que o yoga significa para ela. Adorei o resultado.
O que é o YOGA?
Expressar por escrito o significado de YOGA no meu percurso
é por si só um desafio.
Tal como o Yoga o é para mim. Um desafio, perante mim
própria, o meu ego e perante o mundo e os outros.
No início foi a respiração. Tentar iniciar um ciclo respiratório pelo abdómen não era propriamente novidade, dada a minha formação profissional e necessidade de o fazer para colocar a voz e fazer locução. O desafio era mesmo conseguir aliar tudo isso aos movimentos de forma “correcta”. Lembro-me de até tonturas ter nos primeiros adho-mukha que fiz…e coordenar tudo? Bolas, que trabalheira, que confusão…Então o yoga não era concentrar para abstrair? E conseguir fazê-lo? Nos primeiros tempos era tão difícil conseguir dedicar a atenção a tudo, da mesma forma que era difícil não pensar no que ia fazer para o jantar a seguir, no dia que tinha tido e nos pormenores das coisas que tinham acontecido e, enfim, vinham os pensamentos mais idiotas à mente. Vá, confessem, quem é que nunca pensou no jantar, na conversa com o amigo, na coisa pendente que tinha de fazer, na lista de compras esquecida na mesa da cozinha, enfim, uma série de coisas “importantíssimas”, na altura, logo naquele momento em que estamos em cima do tapete e em que “bastava” a concentração na respiração, alinhamento/postura e no mergulho por dentro que é uma prática de asana…
No início foi a respiração. Tentar iniciar um ciclo respiratório pelo abdómen não era propriamente novidade, dada a minha formação profissional e necessidade de o fazer para colocar a voz e fazer locução. O desafio era mesmo conseguir aliar tudo isso aos movimentos de forma “correcta”. Lembro-me de até tonturas ter nos primeiros adho-mukha que fiz…e coordenar tudo? Bolas, que trabalheira, que confusão…Então o yoga não era concentrar para abstrair? E conseguir fazê-lo? Nos primeiros tempos era tão difícil conseguir dedicar a atenção a tudo, da mesma forma que era difícil não pensar no que ia fazer para o jantar a seguir, no dia que tinha tido e nos pormenores das coisas que tinham acontecido e, enfim, vinham os pensamentos mais idiotas à mente. Vá, confessem, quem é que nunca pensou no jantar, na conversa com o amigo, na coisa pendente que tinha de fazer, na lista de compras esquecida na mesa da cozinha, enfim, uma série de coisas “importantíssimas”, na altura, logo naquele momento em que estamos em cima do tapete e em que “bastava” a concentração na respiração, alinhamento/postura e no mergulho por dentro que é uma prática de asana…
Se aquelas
primeiras aulas de yoga tivessem um cartoon,
seria uma implosão de pensamentos e de coisas a que queria estar atenta. A
melhor metáfora que me ocorre das primeiras aulas de yoga é como quando estamos
a aprender a conduzir. Até que determinadas coisas entrem em modo “piloto
automático”, ui, que confusão que era! O alinhamento, a respiração, a
coordenação da respiração com movimentos… e atrever-me e desafiar-me a fazer a
aula toda sem me frustrar, ui! As primeiras aulas de yoga foram isso mesmo:
aprender a lidar e gerir a frustração perante mim própria, nesse mergulho para
dentro que representava aquela hora de prática.
Sentar-me com
as costinhas “direitas” e respirar.
Parece fácil, não? Humhum, pois. Até podia ser se todas as rotinas que estão
embrenhadas em nós não nos conduzissem na direcção contrária. Passamos grande
parte do dia, ou ao PC, tortos, ou de pé e com a bacia desencaixada, ou enquanto andamos, sempre com a cervical inclinada
para o telemóvel, ao qual não damos descanso. Chegar a uma aula de yoga depois
de um dia de 8/9h de trabalho e com as preocupações diárias que a rotina assim “exige”, nem sempre é “fácil”. Quando a
aula termina, é uma delícia e invade-nos aquele pensamento sempre “ainda bem
que vim!”, mas sair do trabalho, atravessar a confusão do trânsito de final do
dia (pensar no trânsito ainda pós-laboral que se irá apanhar depois da aula!), chegar
lá e começá-la, nem sempre é a coisa mais sedutora do mundo… por mais que
amemos e nos dediquemos à nossa prática, por mais que nos esforcemos e mesmo em
alturas em que temos perfeita noção que se não formos àquela aula, dificilmente
iremos compensar a prática em casa. Ufa, que correria. (Fiquei cansada só de
escrever estas últimas linhas, eheh...) Ora bem, para nós que andamos aqui no lufa-lufa da cidade e ainda conseguimos
ir a uma aulinha às 19h00, só sentar no tapete uns minutos para aquietar é um
desafio gigante. A cabeça não pára, é assim que a habituámos há muito tempo.
Não há botões mágicos, nada. Só mesmo a nossa concentração, essa sim, consegue
coisas e efeitos mágicos. É como tudo
na vida, uns dias melhor, outros pior. Portanto, atrevo-me a dizer que por mais
anos que passem e se ganhe espaço, se melhorem posturas, flexibilidade, etc,
aquilo que a minha caminhada me tem mostrado é que é TUDO impermanente, tal
como a forma como olhamos para o mundo, para o yoga e como praticamos, claro.
No meu
trilho pessoal, já tive alturas em que praticava asana duas vezes por dia e agora que olho para esses tempos,
reconheço que fazia tudo menos yoga.
Fazia posturas e mexia o corpo, é certo, mas a minha cabeça não estava alinhada
com o coração, mas sim com o ego. Estava numa boa condição física (como nunca
pensei que o yoga permitisse!), tinha bastante tempo livre e a prática de asana matinal e ao fim do dia tornou-se,
praticamente, uma obrigação. Mas…ficava com um sentimento de culpa estranho,
caso não praticasse. Ora bem, isso não será violentar-me? Não se confunda
disciplina com inflexibilidade e intolerância. Lá está, o limbo entre o
equilíbrio e desequilíbrio é aquele ponto que não se vê, quase, mas que existe.
Um bocadinho mais para o lado e caímos, daí a dificuldade em mantermo-nos no
meio. Se fosse fácil, não precisávamos de passar a vida toda a aprendê-lo. Ainda
que, também, por vezes, seja necessário ir aos extremos para se descobrir o que
não se quer e ir algures ali até ao meio.
Yoga para
mim é consciência, é ter a humildade de olharmos para dentro, mas aquele dentro
em que cumprimentamos o “ego” -reconhecemo-lo mas não o alimentamos nem focamos
a atenção unicamente nele – e tomamos consciência de nós e dos outros. De nós
com os outros e com o mundo em geral. Yoga é vestirmos o papel de observador a toda a hora, mas sem que
isso represente uma obrigação, é algo que se vai tornando quase que
inconsciente, por mais paradoxo que possa soar. É uma consciência constante e
permamente nesta impermanência da vida, nestas rotinas em piloto-automático, em
que agimos de forma quase que desligada de tudo e de todos.
Yoga é respirar consciência, observação, humildade e a tão bela “compaixão”. E parece um paradoxo, da mesma forma que é necessário concentrarmo-nos para nos abstrairmos ou estarmos atentos a nós de tal forma para nos conseguirmos observar e tentar compreender e ter compaixão perante o próximo. Afinal, só um “desapego” e uma “acção verdadeiramente desinteressada” nos vai conduzindo a qualquer lugar melhor que este.
A música que agora ouço enquanto escrevo é de Fink e chama-se “Truth begins” e o refrão refere algo como “Layers on layers, layers on layers. The journey unravels, and the truth begins, begins, begins”. E o yoga anda de mãos dadas com a vida como se de camadas se tratasse. Se cada passo que damos é mais uma camada que acumulamos a outra e a tantas outras camadas e camadas de caminhadas e aprendizagens, em algum momento percebemos que não percebemos nada mas que a quietude é o melhor amigo das dúvidas, do receio, do apego… O olho do furacão é sempre o local onde as condições atmosféricas são mais amenas… Eis que a “verdade” aparece. A nossa verdade, o que faz sentido para nós, a forma honesta e tranquila de estar na vida, perante os desafios e as dificuldades e o sofrimento. Se nos desapegarmos dos apelos constantes a que o nosso ego reage pelos estímulos todos lá de fora, do dia-a-dia, seremos, sem dúvida, mais verdadeiros connosco próprios.
Yoga é respirar consciência, observação, humildade e a tão bela “compaixão”. E parece um paradoxo, da mesma forma que é necessário concentrarmo-nos para nos abstrairmos ou estarmos atentos a nós de tal forma para nos conseguirmos observar e tentar compreender e ter compaixão perante o próximo. Afinal, só um “desapego” e uma “acção verdadeiramente desinteressada” nos vai conduzindo a qualquer lugar melhor que este.
A música que agora ouço enquanto escrevo é de Fink e chama-se “Truth begins” e o refrão refere algo como “Layers on layers, layers on layers. The journey unravels, and the truth begins, begins, begins”. E o yoga anda de mãos dadas com a vida como se de camadas se tratasse. Se cada passo que damos é mais uma camada que acumulamos a outra e a tantas outras camadas e camadas de caminhadas e aprendizagens, em algum momento percebemos que não percebemos nada mas que a quietude é o melhor amigo das dúvidas, do receio, do apego… O olho do furacão é sempre o local onde as condições atmosféricas são mais amenas… Eis que a “verdade” aparece. A nossa verdade, o que faz sentido para nós, a forma honesta e tranquila de estar na vida, perante os desafios e as dificuldades e o sofrimento. Se nos desapegarmos dos apelos constantes a que o nosso ego reage pelos estímulos todos lá de fora, do dia-a-dia, seremos, sem dúvida, mais verdadeiros connosco próprios.
Yoga não
são só asanas (ainda que durante
muito tempo tenha pensado que sim), não é sentar de pernas cruzadas, respirar e
fazer “jñána mudrá”, emitir o som “Om”
e desejar paz para nós, os outros e o universo. Não é perpetuar clichés nem
continuar a dizer aquilo que o Yoga não é (ou não deveria, pelo menos, ser!).
Podia também lançar a provocação que é só arranjar tempo para respirar e
expandir, mexer o corpo, já que é o nosso veículo para essa mesma expansão e
viagem e, pronto, só falta alinhá-lo com a mente. Afinal, trata-se “apenas” de unir o coração e a mente. O
que fazemos para o conseguir é a caminhada da vida… E talvez partamos sem o
conseguir fazer mas, pelo menos, existe a intenção (e acção!) de viver
conscientemente. A descoberta do que andamos para aqui a fazer, do que é poder
viver conscientes, fieis e verdadeiros connosco e com os outros. Amar de forma
livre e incondicional, passar a ver a vida e a vermo-nos de outra forma. Não necessariamente de
forma oposta à que vivíamos antes mas, por norma, os vários relatos e histórias
que ouvimos, referem-se sempre a um “antes” e “depois” do yoga na vida das
pessoas.
Há mesmo
quem mude radical e repentinamente e passe a rejeitar todas as rotinas e
processos desenvolvidos até à introdução ao yoga. Há variadíssimos desabafos e
textos sobre as mudanças e alterações na vida de cada um, é comum referir-se a
forma como se olha para a vida e isso pode implicar a alimentação, as rotinas
diárias, até mesmo os amigos e companhias que sempre fizeram sentido para nós,
tal como determinados padrões comportamentais. E, de repente, mergulhamos numa
bolha cujo timing depende de cada um…
e as mudanças se podem ser subtis e vão acontecendo tão internamente que,
quando se sentem, são enormes.
Há quem não
consiga abdicar de todos os hábitos de outrora, há quem os mude totalmente. Há
quem se afaste do círculo de amigos habitual e passe a não conseguir gerir
antigas relações, há quem deixe de fazer determinados programas, há quem
aprenda a gostar de estar sozinho e há quem passe a apreciar e a aperceber-se
do quão necessário é ouvir o silêncio.
Pode haver,
também, uma fase em que durante a descoberta desta forma de ver o mundo - como
se tudo fosse mais transparente aos nossos olhos e estivéssemos mais
conscientes e sensíveis ao mundo em geral e, quase que paradoxal e
simultaneamente, mais abstraídos dos impulsos desse mesmo mundo – nos julgamos
mais atentos que os outros. Ora bem,
lá está o ego a pregar-nos uma partida. “Ego” talvez tenha sido a palavra que
mais ouvi da boca do meu primeiro e querido professor de yoga… “ego” para aqui,
“ego” para acolá… e como o significado atribuído às palavras varia em função,
quer das áreas de estudo, quer do contexto, eu lá me questionava sobre algumas
coisas que a Psicologia me dizia… Não há problema em ter ego, aliás, temos de o
ter, desde que não o deixemos conduzir-nos por esse mundo fora. Senão, a visão
que temos sobre o mundo será sempre de dualidade, de separação: de nós e dos
outros. E o que o Yoga me tem ensinado, enquanto forma de viver, é exactamente
o oposto. É união. Sem querer cair em redundâncias, talvez tentar explicar o
que é Yoga parta mim seja mais fácil do que julguei…(como se a simplicidade não
trouxesse consigo toda a complexidade do processo até lá…). Se escrevo estas
coisas (num registo bem oral, diga-se de passagem), talvez seja porque me
revejo plenamente nestes processos todos.
Enquando continuo
a escrever, continuo a ouvir Fink, desta vez, uma música em que ele colabora
com Bonobo (“If You Stayed Over”) e que tem uma
passagem: “Breathe in the future, breathe
out the past”, curioso como esta metáfora poderia ser utilizada, se o
passado representasse as preocupações e lições aprendidas e o futuro, apenas as
coisas boas, as expectativas, a esperança. Mas daqui podemos sempre saltitar
para outra questão: e por que não inspirar e expirar o presente, apenas? Claro
que a construção do que somos é a soma de tudo o já fomos, mas não dispendemos
demasiada energia a pensar no passado e a projectar o futuro? Andamos sempre
aos trambolhões de expectativas e furacões de emoções… Se yoga é, também, a
consciência de tudo “aqui e agora”, se não há mais nada além disso, se tudo é
impermanente, então que estejamos a 200% no agora porque é a única certeza que
temos, é de estarmos aqui.
Consciência,
liberdade, verdade, permanência, evolução, caminhada, luz …são palavras que
associo ao Yoga. Felicidade e consciência. E a (tão tramada por tão difícil que é, por vezes!) compaixão que vem com a
aceitação.
Yoga é
respirar contemplação, abraçar o sol da consciência e viver de forma mais
livre, tolerante, flexível e feliz. Primeiro connosco próprios, numa lógica do
desapego e sem dar grandes ouvidos aos pedidos do ego e, depois, com os outros
e o universo em geral. E tudo vem por acréscimo…pensar em várias opções e
tentar ver o mundo de outra perspectiva. Não é só quando estamos no tapete,
numa invertida, que vemos o mundo ao contrário. É preciso fazê-lo sempre que os
desafios destes novos ritmos nos preguem sustos.
Yoga é
arranjar espaço dentro (e de dentro para fora) de nós. Expandir a caixa
toráxica, a capacidade respiratória, a flexibilidade, a força, etc, claro…
E expandir, acima de tudo, a consciência… e o coração.
Maravilha...
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